Marcos 5:1-10:31
O Livro
A cura do homem endemoninhado
(Mt 8.28-34; Lc 8.26-37)
5 Chegaram ao outro lado do lago, à terra dos Gerasenos. 2 Ao desambarcar, um homem vindo dum cemitério, possuído por um espírito impuro, veio ao seu encontro. 3 Este homem morava entre os túmulos e ninguém conseguia prendê-lo nem sequer com correntes. 4 Pois muitas vezes o tentaram prender com grilhões e correntes, mas ele partia os grilhões dos pulsos e despedaçava as correntes, sem que ninguém conseguisse dominá-lo. 5 Durante o dia e pela noite dentro, errava entre os túmulos e pelos montes desertos, dando gritos e ferindo-se com pedras.
6 Mal viu Jesus, vinha este ainda longe, correu ao seu encontro. E deitando-se no chão à sua frente, 7 soltou um grito forte: “Que queres tu de mim, Jesus, Filho do Deus altíssimo? Peço-te por Deus que não me atormentes!” 8 Jesus falou ao demónio que existia dentro dele: “Sai deste homem, espírito impuro!”
9 “Como te chamas?” perguntou Jesus. “Exército, porque somos muitos.” 10 E pedia com insistência a Jesus que não os expulsasse para fora da região. 11 Ora, andava ali perto, no monte acima do lago, uma grande vara de porcos a pastar, 12 e os demónios rogaram-lhe: “Manda-nos para aqueles porcos.” 13 Jesus concordou. Então, os espíritos impuros saíram do homem e entraram nos porcos. A vara de 2000 porcos precipitou-se, caindo por um despenhadeiro no mar, onde se afogou.
14 Os porqueiros fugiram para a cidade e campos, espalhando a notícia, e as pessoas vieram ver o que tinha sucedido. 15 As pessoas dirigiram-se ao encontro de Jesus e viram o endemoninhado ali sentado, agora vestido e em seu perfeito juízo, e ficaram com medo. 16 Aqueles que tinham assistido ao que tinha acontecido ao endemoninhado contavam aos outros. 17 E a multidão chegou até a pedir a Jesus que fosse embora da região.
18 Assim, voltou para o barco e o homem que tinha andado possuído dos demónios pediu a Jesus que o deixasse acompanhá-los. 19 Mas Jesus não quis: “Volta para a tua família e conta-lhe as maravilhas que o Senhor te fez e como foi tão bondoso contigo.” 20 O homem partiu, para percorrer as Dez Cidades, e contava a toda a gente as grandes coisas que Jesus lhe tinha feito, e todos ficavam pasmados a ouvi-lo.
Uma menina morta e uma mulher doente
(Mt 9.18-26; Lc 8.41-56)
21 Quando Jesus atravessou de barco para a outra margem do lago, uma enorme multidão juntou-se à sua volta na praia. 22 O líder da sinagoga daquele lugar, cujo nome era Jairo, veio e prostrou-se a seus pés, 23 suplicando-lhe com insistência: “A minha filha está às portas da morte. Vem colocar as mãos sobre ela para ser curada, e ela ficará viva!” 24 Jesus foi com ele. Uma grande multidão o acompanhava e comprimia.
25 Entre todo aquele povo encontrava-se uma mulher que sofria, havia doze anos, de uma perda de sangue. 26 Durante esse tempo padecera bastante às mãos de muitos médicos, e tinha gasto tanto com eles que ficara pobre, sem ver quaisquer melhoras; antes piorara. 27 Ouvira falar tanto nos espantosos milagres de Jesus que; aproximou-se no meio da multidão por trás e tocou-lhe no manto, 28 pois dizia: “Se ao menos eu lhe tocar no manto, ficarei curada.” 29 De facto, logo que lhe tocou, o sangue parou de correr e percebeu que estava curada.
30 Jesus de imediato sentiu que saíra de si poder e, olhando para trás, perguntou: “Quem foi que me tocou na roupa?”
31 Os discípulos disseram-lhe: “Com toda esta gente à tua volta, ainda perguntas quem te tocou?”
32 Ele continuou a olhar à sua volta para encontrar quem fizera aquilo. 33 Então a mulher, amedrontada e a tremer, sabedora do que lhe tinha acontecido, chegou-se, pôs-se de joelhos diante dele e declarou o que tinha feito. 34 Jesus disse-lhe: “Filha, a tua fé te curou! Vai em paz, estás livre do teu mal!”
35 Jesus falava ainda com ela, quando chegaram uns mensageiros da casa de Jairo, líder da sinagoga, com a notícia: “A tua filha já morreu. Porque estás ainda a incomodar o Mestre?”
36 Jesus, contudo, não fez caso do que diziam e disse para o líder da sinagoga: “Não tenhas medo, crê somente!” 37 Jesus não deixou ninguém acompanhá-lo a não ser Pedro, Tiago e João. 38 Quando chegaram, havia uma grande confusão, ouvindo-se choro e lamentações. 39 E dirigiu-se aos que ali estavam: “Para que é todo este choro e alvoroço? A menina não está morta, apenas dorme!”
40 E riram-se de troça. Mas Jesus mandou todos saírem e, acompanhado do pai e da mãe da criança e dos três discípulos, entrou no quarto onde estava deitada. 41 E segurando-lhe na mão, disse: “Talita kum!” (Que quer dizer: “Menina, levanta-te!”) 42 E a menina, que tinha doze anos de idade, pôs-se imediatamente de pé e começou a andar. Os pais ficaram pasmados. 43 Jesus recomendou-lhes muito que não contassem aquilo a ninguém e mandou que dessem de comer à filha.
Um profeta sem honra
(Mt 13.54-58; Lc 4.16-30)
6 Logo depois disto, Jesus saiu daquela parte do país e voltou com os discípulos para a sua terra. 2 No sábado seguinte, foi à sinagoga e começou a ensinar. Ao ouvirem-no, muitos ficaram admirados com a sua sabedoria e milagres. E diziam: “De onde lhe veio toda esta sabedoria? Como pode realizar tais milagres com as próprias mãos? 3 Não é ele o carpinteiro, filho de Maria? Não é irmão de Tiago, José, Judas e Simão? E as suas irmãs não moram aqui mesmo, nesta localidade?” E estavam escandalizados com ele. 4 Então Jesus disse-lhes: “Um profeta é honrado em qualquer lugar menos na sua terra, entre o seus parentes e no meio da própria casa.” 5 Por não acreditarem nele, Jesus não pôde fazer ali nenhum grande milagre, a não ser colocar as mãos sobre alguns doentes e curá-los. 6 Jesus estava admirado por causa da falta de fé deles.
Jesus envia os doze discípulos
(Mt 10.1, 9-14; Lc 9.1-6)
E andava pelas aldeias em redor a ensinar. 7 Chamou os doze discípulos, começou a enviá-los dois a dois e deu-lhes autoridade sobre os espíritos impuros. 8 Disse-lhes: “Nada levem convosco a não ser o bordão; nem comida, nem saco de viagem, nem dinheiro de cobre à cintura; 9 sandálias, só as que tiverem nos pés, e nem mesmo uma muda de roupa.” 10 E acrescentou: “Sempre que entrarem numa casa, fiquem nela até à vossa partida. 11 Se uma qualquer localidade não vos receber nem ouvir, sacudam a poeira dos vossos pés, quando saírem, como testemunho de que abandonaram essa terra à sua própria sorte.”
12 Então os discípulos partiram, incitando todos os que encontravam a abandonarem o pecado. 13 Expulsaram muitos demónios e curaram muitos doentes, ungindo-os com azeite.
João Batista é degolado
(Mt 14.1-12; Lc 9.7-9)
14 Não tardou que o rei Herodes ouvisse falar de Jesus, cujos milagres eram contados com espanto em toda a parte. Algumas pessoas declaravam que era João Batista que tinha voltado à vida. Por isso, diziam: “Não admira que possa fazer tais milagres!”
15 Havia gente também que pensava que Jesus fosse Elias; outros, ainda, afirmavam que era um novo profeta igual aos do passado. 16 Herodes, ao tomar conhecimento destes factos, disse: “Não! É João, a quem degolei. Ressuscitou dentre os mortos!”
17-19 Porque Herodes mandara soldados meter João no cárcere, por andar sempre a dizer que não estava certo este casar-se com Herodíade, mulher de Filipe, irmão do próprio rei. Para se vingar, Herodíade queria que João fosse morto; mas sem a aprovação de Herodes nada podia fazer. 20 Porque Herodes respeitava João, sabendo que era um homem justo e santo e protegia-o. Sempre que falava com João, Herodes ficava preocupado, mas gostava de ouvi-lo.
21 Até que, por fim, chegou a oportunidade que Herodíade esperava. Herodes fazia anos e dera uma festa para a gente do palácio, para os oficiais do exército e para as pessoas importantes da Galileia. 22 A certa altura, entrou a filha de Herodíade que dançou na presença dos convidados e agradou a todos. 23 “Pede-me o que quiseres”, prometeu o rei, “que eu dou-te nem que seja metade do meu reino.”
24 Ouvindo isto, ela saiu para se aconselhar junto da mãe, que lhe disse: “Pede-lhe a cabeça de João Batista!”
25 Então voltou à presença do rei: “Dá-me a cabeça de João Batista numa bandeja!”
26 O rei ficou muito triste com o pedido, mas teve vergonha de quebrar o juramento diante dos convidados. 27 Mandou então um membro da sua guarda pessoal à prisão cortar a cabeça de João e trazê-la. O soldado matou João no cárcere 28 e trouxe a sua cabeça numa bandeja, entregando-a à jovem, que a levou à mãe. 29 Quando os discípulos de João souberam o que tinha acontecido, foram buscar o corpo e sepultaram-no num túmulo.
Jesus alimenta 5000 homens
(Mt 14.13-21; Lc 9.10-17; Jo 6.1-13)
30 Por fim, os apóstolos voltaram da sua viagem. Foram ter com Jesus e contaram-lhe tudo o que tinham feito e como tinham falado às populações visitadas.
31 Jesus disse-lhes: “Saiamos por um pouco do meio do povo para descansar.” Pois era tanta a gente que ia e vinha que mal tinham tempo para comer. 32 E saíram de barco para um sítio mais sossegado. 33 Contudo, muitos aperceberam-se disso e, correndo pela praia, foram esperá-los no ponto de desembarque. 34 Quando Jesus saiu do barco, já lá se encontrava uma enorme multidão; teve compaixão deles, porque eram como ovelhas sem pastor e ensinou-lhes muitas coisas que precisavam de saber.
35 Como a hora já fosse bastante avançada, os discípulos foram ter com Jesus e disseram: 36 “Este lugar é deserto e a hora já vai avançada. Manda o povo retirar-se, para ir às aldeias e campos dos arredores comprar alguma coisa para comer.”
37 Jesus respondeu: “Deem-lhes vocês de comer.” Responderam: “Como? Seria preciso duzentas moedas de prata[a] para comprar comida para tanta gente!”
38 “Quanta comida temos? Vão ver.” Eles voltaram, dizendo que havia cinco pães e dois peixes. 39 Então Jesus disse à multidão que se sentasse. E sentaram-se, na erva verde, 40 em grupos de cinquenta ou cem. 41 E tomando os cinco pães e os dois peixes, Jesus ergueu os olhos para o céu e abençoou-os. Depois, partiu os pães em pedaços e deu-os aos discípulos, para que os oferecessem ao povo. E distribuiu também os dois peixes entre todos. 42 Todos comeram até ficarem satisfeitos. 43 E quando os sobejos foram recolhidos, as sobras dos peixes enchiam doze cestos. 44 O número de homens que comeu foi de 5000.
Jesus anda sobre as águas
45 Logo a seguir, Jesus mandou os discípulos voltar para o barco e partir à sua frente, atravessando o lago até Betsaida, enquanto ele tratava de mandar a multidão embora. 46 Depois disto, Jesus subiu à montanha para orar.
47 Caiu a noite, o barco já estava no meio do lago e ele ainda se encontrava sozinho em terra. 48 Jesus viu que remavam com dificuldades, pois o vento soprava em sentido contrário. Por volta das quatro horas da madrugada, foi ter com eles, a caminhar sobre a água, e ia passar-lhes adiante. 49 Ao verem-no caminhar sobre a água, gritaram de terror, pensando que fosse um fantasma. 50 Todos o viam e ficaram inquietos. Imediatamente ele lhes disse: “Está tudo bem, sou eu, não tenham medo!” 51 Então subiu para o barco e o vento cessou.
Os discípulos ficaram ali sentados, de boca aberta, sem compreender o que se passara. 52 Porque ainda não tinham percebido quem Jesus realmente era, nem mesmo depois do milagre da tarde anterior. Os seus corações estavam endurecidos.
53 Quando chegaram a Genezaré, do outro lado do lago, amarraram o barco. 54 Mal desembarcaram, os habitantes reconheceram-no logo. 55 Percorriam toda a região, começando a trazer-lhe os doentes em esteiras e padiolas. 56 Aonde quer que fosse, aldeias, cidades e campo, punham os doentes nas praças e ruas, pedindo que os deixasse ao menos tocar na borda da sua roupa. E todos os que lhe tocavam ficavam curados.
O que contamina o ser humano
(Mt 15.1-20)
7 Um dia, chegaram de Jerusalém uns fariseus e especialistas na Lei para falarem com Jesus. 2 E notaram que alguns dos seus discípulos comiam com as mãos impuras, isto é, sem as lavarem. 3 (Porque os judeus, sobretudo os que são fariseus, nunca comem sem lavar ritualmente as mãos, conforme o exigem as antigas tradições[b]. 4 E quando voltam da rua para casa, devem sempre lavar-se deste modo antes de tocar em qualquer comida. Este é apenas um entre os muitos exemplos das leis a que se agarraram, tais como o ritual de purificação de vasilhas, panelas e pratos.) 5 Os fariseus e especialistas na Lei perguntaram-lhe: “Porque não seguem os teus discípulos os costumes dos antigos e comem com as mãos impuras?”
6 Jesus respondeu: “Fingidos! Bem falou Isaías, o profeta, a vosso respeito:
‘Este povo honra-me de mim com os lábios,
mas o seu coração está longe de mim.
7 Os seus atos de adoração são vazios,
porque ensinam doutrinas criadas por homens.’[c]
8 Isaías bem tinha razão! Porque vocês desprezam as ordens expressas de Deus para porem no seu lugar as vossas próprias tradições. 9 Rejeitam os mandamentos bem claros de Deus para manter as vossas próprias tradições.
10 Por exemplo: Moisés ordenou-vos da parte de Deus: ‘Honra o teu pai e a tua mãe’,[d] acrescentando que ‘todo aquele que falar contra o pai ou a mãe deverá ser morto.’[e] 11-12 Mas vocês dizem: ‘Mesmo que os teus pais estejam a passar mal, podes dar a Deus o dinheiro que seria para o sustento deles.’ 13 Assim ofendem a Lei divina para defender as vossas tradições criadas por homens. E isto é só um exemplo, porque há muitos mais.”
14 Então chamou de novo a multidão e disse-lhe: “Escutem todos o que vos digo e procurem entender. 15 Não há nada exterior ao homem que ao entrar nele o torne impuro; antes o que sai dele é que o torna impuro.” 16 Quem tem ouvidos para ouvir ouça.
17 Depois de deixar aquele povo, entrou numa casa e os discípulos perguntaram-lhe o que queria dizer com a parábola que acabara de contar. 18 “Então não entendem?”, perguntou-lhes. “Não percebem que nada do que vem do exterior e entra no homem pode torná-lo impuro? 19 Pois não vai para o coração, mas para o estômago e é lançado na latrina.” Com estas palavras, Jesus queria dizer que todos os alimentos ficam puros, independentemente de se lavarem as mãos.
20 E acrescentou: “O que sai do homem é que o torna impuro. 21 Porque do seu íntimo, do seu coração, vêm os maus pensamentos, imoralidades sexuais, roubos, homicídios, 22 adultérios, cobiça, maldades, engano, indecências, inveja, calúnia, orgulho e coisas insensatas. 23 Todas essas coisas más procedem do íntimo da pessoa; são elas que tornam o homem impuro.”
A fé da estrangeira
(Mt 15.21-28)
24 Depois, saiu da Galileia e foi para a região de Tiro e Sídon, mas não conseguiu esconder que estava ali. Como de costume, a notícia da sua chegada depressa se espalhou. 25 Imediatamente foi procurado por uma mulher cuja filha estava possuída por um espírito impuro. Como tinha já ouvido falar em Jesus, aproximou-se dele e prostrou-se aos seus pés, 26 pedindo-lhe muito que livrasse a filha do poder do demónio. Tratava-se de uma siro-fenícia, uma estrangeira, e por isso desprezada pelos judeus. 27 Jesus disse-lhe: “Primeiro tenho que ajudar os da minha família, os judeus. Não está certo tirar o pão aos filhos e lançá-la aos cães.”
28 Ela replicou: “Senhor, até os cachorrinhos comem, debaixo da mesa, das migalhas dos filhos.”
29 “Estás certa! Respondeste tão bem que já curei a tua filhinha!” 30 E quando chegou a casa, encontrou a filha sossegada, na cama; o demónio tinha-a deixado.
A cura do surdo-mudo
(Mt 15.29-31)
31 De Tiro foi para Sídon, voltando em seguida ao mar da Galileia pelo caminho das Dez Cidades. 32 E trouxeram-lhe um surdo que tinha um defeito na fala e todos lhe pediam que pusesse as mãos sobre o homem e o curasse. 33 Então Jesus, afastando-o da multidão, pôs os dedos nos ouvidos do homem e, cuspindo, tocou-lhe na língua com a sua saliva. 34 Levantando os olhos para o céu, suspirou e ordenou: “Effata!”, que significa “Abram-se!” 35 No mesmo instante, o homem começou a ouvir e a falar perfeitamente.
36 Jesus recomendou à multidão que não espalhasse a notícia; mas quanto mais proibia, mais o facto se divulgava. 37 Porque toda a gente sentia enorme espanto, dizendo a cada instante: “Tudo o que faz é maravilhoso! Os surdos ouvem e os mudos falam!”
Jesus alimenta 4000 homens
(Mt 15.32-39)
8 Naquele tempo, estando outra grande multidão reunida, o povo ficou novamente sem provisões. Jesus chamou os discípulos para perto de si e disse: 2 “Sinto compaixão desta gente, porque estão comigo há três dias e não têm com que se alimentar. 3 Se os mandar embora com fome, desfalecem pelo caminho, pois alguns vêm de muito longe.” 4 Os discípulos responderam-lhe: “E onde se poderá aqui num deserto arranjar pão para alimentá-los?” 5 “Quantos pães têm?”, inquiriu. “Sete”, responderam.
6 Mandou então que todos se sentassem no chão. E tomando os sete pães, deu graças a Deus, partiu-os em pedaços e entregou-os aos discípulos, para os levarem à multidão; e estes assim fizeram. 7 Encontraram também alguns peixinhos que Jesus igualmente abençoou e mandou os discípulos servir.
8 E a multidão comeu até ficar satisfeita. Recolhidas as sobras, ainda sobejaram sete cestos. 9 Havia cerca de 4000 homens. Então mandou-os embora.
Os religiosos pedem um sinal
(Mt 16.1-4)
10 Logo a seguir entrou num barco com os discípulos e foi para a região de Dalmanuta. 11 Quando os fariseus daquela terra souberam da sua chegada, vieram e começaram a discutir com ele, pedindo-lhe que fizesse um sinal do céu, para o porem à prova. 12 Ao ouvir estas palavras, sentiu-se profundamente triste no seu espírito e disse: “Porque pede esta geração um sinal? É realmente como vos digo: não receberá nenhum sinal!” 13 Então deixou-os e voltou para o barco, atravessando para a outra margem do lago.
O fermento dos fariseus e de Herodes
(Mt 16.5-12)
14 Os discípulos, contudo, tinham-se esquecido de fazer provisão de comida antes de partirem, pelo que só tinham um pão a bordo. 15 Durante a travessia, Jesus disse-lhes muito solenemente: “Prestem atenção, tenham cuidado com o fermento do rei Herodes e dos fariseus.”
16 “Que quererá dizer?”, perguntavam os discípulos uns aos outros. E chegaram à conclusão de que devia referir-se ao facto de se terem esquecido de levar pão.
17 Jesus percebeu o que discutiam entre si: “Porque se preocupam tanto por não terem pão? Nunca chegaram a compreender? Será porventura o vosso coração demasiado duro para entender isto? 18 Se têm olhos, porque não veem? Se têm ouvidos, porque não ouvem? Já não se lembram? 19 E os 5000 homens que alimentei só com cinco pães? Quantos cestos cheios de sobras recolheram depois?” Disseram: “Doze.” 20 “E quando alimentei os 4000 com sete pães, quanto sobejou?” Responderam: “Sete cestos cheios.” 21 Jesus disse-lhes: “Não perceberam ainda?”
A cura do cego de Betsaida
22 Quando chegaram a Betsaida, algumas pessoas trouxeram-lhe um cego, pedindo-lhe que tocasse nele e o curasse. 23 Jesus tomou o cego pela mão e levou-o para fora da aldeia. Aí, cuspiu-lhe nos olhos e pôs as mãos em cima deles. “Já vês alguma coisa?”, perguntou a seguir.
24 O homem olhou em volta: “Sim! Vejo homens mas não os distingo bem; parecem troncos de árvore a andar de um lado para o outro.”
25 Então pôs outra vez as mãos em cima dos olhos do homem e, quando olhou bem, tinha recuperado completamente a visão e via claramente o que se passava à sua volta. 26 Jesus mandou-o para casa, para junto da família. “Não passes sequer pela aldeia”, recomendou-lhe.
A confissão de Pedro sobre Jesus
(Mt 16.13-16, 20; Lc 9.18-21)
27 Jesus e os discípulos saíram da Galileia e foram para as vilas de Cesareia de Filipe. Enquanto caminhavam, perguntou-lhes: “Quem diz o povo que eu sou?”
28 “Há quem diga que és João Batista. Outros afirmam que és Elias ou um dos outros profetas.”
29 Então perguntou-lhes: “E vocês, quem pensam que eu sou?” Pedro respondeu: “Tu és o Cristo!” 30 Jesus recomendou-lhes que não o dissessem a ninguém.
Jesus fala da sua morte
(Mt 16.21-23; Lc 9.22)
31 E começou a ensiná-los: “O Filho do Homem está destinado a passar por muitos sofrimentos, ser rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos especialistas na Lei e ser morto, mas três dias depois ressuscitará.” 32 Falando com eles abertamente, Pedro chamou-o à parte e começou a repreendê-lo.
33 Jesus voltou-se, e depois de olhar para os discípulos, disse severamente a Pedro: “Vai para trás de mim, Satanás! Vês as coisas do ponto de vista humano e não do ponto de vista de Deus.”
Como ser discípulo de Cristo
(Mt 16.24-28; Lc 9.23-27)
34 Chamando os discípulos e o povo para o ouvirem, falou-lhes assim: “Se alguém quiser ser meu seguidor, tem de esquecer-se de si próprio, tomar a sua cruz e seguir-me. 35 Quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á. E quem perder a sua vida por minha causa e por causa do evangelho salvá-la-á. 36 Que lucro terá o homem em ganhar o mundo inteiro e causar dano à própria vida? 37 Haverá alguma coisa mais valiosa do que a própria vida da pessoa? 38 Quem se envergonhar de mim e das minhas palavras, no meio desta geração adúltera e pecadora, também o Filho do Homem se envergonhará desse, quando vier na glória de seu Pai com os santos anjos.”
9 Falando ainda com os discípulos, Jesus continuou: “É realmente como vos digo: alguns dos que estão aqui agora não morrerão sem ver o reino de Deus chegar com grande poder!”
Jesus transfigura-se
(Mt 17.1-13; Lc 9.28-36)
2 Passados seis dias, Jesus levou Pedro, Tiago e João ao cimo de um alto monte. Não havia ali mais ninguém. 3 O aspeto de Jesus mudou e a sua roupa ficou de uma brancura deslumbrante que nenhum processo humano conseguiria alcançar. 4 Então apareceram Elias e Moisés e puseram-se a falar com Jesus.
5 “Mestre, que bom é estarmos aqui!”, exclamou Pedro. “Façamos três tendas: um para ti, outro para Moisés e outro para Elias!” 6 Falava assim por nada mais lhe vir à ideia. Estavam cheios de espanto. 7 Então uma nuvem cobriu-os e dela saiu uma voz que disse: “Este é o meu Filho amado. Ouçam-no!”
8 Nesse momento olharam em torno, não viram mais ninguém com eles, senão apenas Jesus.
9 Enquanto desciam do monte, Jesus recomendou-lhes que não relatassem a ninguém o que tinham visto, até que o Filho do Homem ressuscitasse dos mortos. 10 Por isso, guardaram o sucedido para si mesmos. Contudo, muitas vezes falavam a respeito disso, perguntando entre si o que quereria ele dizer com “levantar-se de entre os mortos.”
11 E perguntaram-lhe: “Porque é que os especialistas na Lei insistem que Elias deve vir antes?”
12 Jesus respondeu: “Elias, de facto, vem primeiro para pôr tudo em ordem. Então porque está escrito que o Filho do Homem deve sofrer e ser rejeitado? 13 Digo-vos: Elias já veio e fizeram dele tudo o que quiseram, como as Escrituras previam.”
A cura do rapaz com um espírito mau
(Mt 17.14-19; Lc 9.37-42)
14 Quando chegaram lá abaixo, encontraram uma grande multidão que rodeava os outros discípulos, enquanto alguns especialistas na Lei discutiam com eles. 15 A multidão olhou com admiração para Jesus, ao vê-lo aproximar-se, e correu a cumprimentá-lo. 16 “Que se passa?”, perguntou.
17 Alguém respondeu do meio da multidão: “Mestre, trouxe o meu filho para que o curasses, pois está dominado por um espírito que não fala. 18 Sempre que o demónio se apodera dele, atira-o ao chão e fá-lo espumar pela boca e ranger os dentes; e assim vai definhando. Pedi aos teus discípulos que expulsassem o demónio, mas não conseguiram.”
19 Jesus disse aos discípulos: “Ó povo sem fé! Até quando terei de andar convosco? Até quando terei de suportar-vos? Tragam-me cá o rapaz!” 20 Trouxeram-lhe o menino, mas ao ver Jesus, o demónio sacudiu em convulsões a criança, que caiu no chão, contorcendo-se e espumando.
21 “Há quanto tempo está ele assim?”, perguntou ao pai.
“Desde pequenino. 22 O demónio fá-lo cair muitas vezes no fogo e na água, para o matar. Tem compaixão de nós e, se puderes, faz alguma coisa!”
23 “Se eu puder?”, perguntou Jesus. “Tudo é possível a quem tem fé!”
24 Ao que o pai respondeu logo: “Eu tenho fé! Ajuda-me a ter mais fé!”
25 Quando Jesus viu que a multidão aumentava, ordenou ao espírito impuro: “Espírito de surdez e mudez, ordeno-te que saias desse menino e não entres mais nele!”
26 Então o espírito soltou um grito terrível, tornou a sacudi-lo e deixou-o em seguida. O menino ficou caído, sem forças, sem se mexer, como se estivesse morto. A multidão começou a dizer à boca pequena: “Morreu!” 27 Mas Jesus tomou-o pela mão, ajudou-o a pôr-se de pé e ele ergueu-se.
28 Mais tarde, estando Jesus sozinho em casa com os discípulos, estes perguntaram-lhe: “Porque não conseguimos expulsar aquele demónio?”
29 “Para casos como este é preciso orar”, respondeu.
Jesus fala outra vez da sua morte e ressurreição
(Mt 17.22-23; Lc 9.43-45)
30 Deixando aquela região, percorreram a Galileia, onde Jesus procurava evitar toda e qualquer atividade pública, 31 para poder dedicar mais tempo a ensinar os discípulos. E dizia-lhes: “O Filho do Homem vai ser entregue nas mãos dos homens, hão de matá-lo mas, três dias depois de ser morto, ressuscitará.” 32 Eles, porém, não compreendiam e tinham medo de lhe fazer perguntas.
Quem é o maior?
(Mt 18.1-5; Lc 9.46-48)
33 Chegaram a Cafarnaum. Quando se encontravam instalados na casa onde iam ficar, perguntou-lhes: “Que vinham a discutir pelo caminho?” 34 Mas tinham vergonha de responder, porque a discussão era sobre qual deles seria o mais importante. 35 Então sentou-se e, chamando-os para junto de si disse: “Quem quiser ser o primeiro será o último e o servo de todos.”
36 Tomando uma criancinha, colocou-a no meio deles, acolheu-a nos braços e disse-lhes: 37 “Quem receber uma criancinha como esta, em meu nome, é a mim que recebe. E quem me receber não é a mim que recebe, mas aquele que me enviou.”
Quem não é contra nós é por nós
(Mt 10.42; Lc 9.49-50)
38 João, um dos seus discípulos, disse-lhe: “Mestre, vimos alguém que se servia do teu nome para expulsar demónios, mas dissemos-lhe que não o fizesse, por não pertencer ao nosso grupo.”
39 “Não o proíbam! Porque ninguém que faça milagres em meu nome vai logo falar mal de mim. 40 Quem não é contra nós está do nosso lado. 41 Se alguém vos der nem que seja um copo de água, por serem de Cristo, é realmente como vos digo, não deixará de ter a sua recompensa.
Não levar os outros a pecar
(Mt 18.8-9; Lc 17.1-2)
42 Quem fizer tropeçar na fé um destes pequeninos que creem em mim, mais valia a esse homem amarrarem-lhe uma mó ao pescoço e ser atirado ao mar. 43-44 Se a tua mão te fizer pecar, corta-a! Mais vale entrar na vida com uma só mão do que ir parar com ambas ao fogo do inferno, que nunca se apaga! 45-46 Se o teu pé te fizer pecar, corta-o! Mais vale entrar na vida coxo do que ser lançado com ambos os pés no inferno. 47 E se o teu olho te fizer pecar, arranca-o! Melhor é entrar no reino de Deus só com um olho do que ser lançado com ambos no inferno, 48 onde os bichos nunca morrem e o fogo nunca se apaga.[f] 49 Porque todos serão como que temperados pelo fogo.
50 O sal é bom para temperar, mas se perder o sabor como pode tornar-se de novo salgado? Vocês devem ter as qualidades do sal e viver em paz uns com os outros.”
O divórcio
(Mt 19.1-9)
10 Dali, Jesus dirigiu-se à região da Judeia, na outra margem do Jordão. Acorreram multidões a ouvi-lo e, como sempre, ele as ensinava. 2 Alguns fariseus foram ter com Jesus, para o pôr à prova, e perguntaram-lhe se era lícito um marido divorciar-se da mulher.
3 “Que disse Moisés sobre o divórcio?”, perguntou-lhes Jesus.
4 “Disse que era permitido; que um homem pode escrever uma declaração de divórcio, entregá-la à mulher e mandá-la embora.”
5 Jesus disse-lhes: “Ele deixou-vos escrito este mandamento por causa da dureza do vosso coração. 6 No entanto, não foi assim que Deus estabeleceu, porque desde o princípio da criação criou o homem e a mulher. 7 Assim, ‘o homem deve deixar o seu pai e a sua mãe, 8 para se unir com a sua mulher, e serão os dois como um só.’[g] Por conseguinte, não mais serão dois, mas como um só. 9 E nenhum homem separe o que Deus juntou.”
10 Mais tarde, estando sozinho com os discípulos em casa, tornaram-lhe a falar naquele assunto. 11 E disse-lhes: “Quem se divorciar da sua mulher para se casar com outra, comete adultério contra ela. 12 E se a mulher se divorciar do marido e se casar outra vez, também comete adultério.”
Jesus e os meninos
(Mt 19.13-15; Lc 18.15-17)
13 E traziam-lhe crianças para que as abençoasse, mas os discípulos diziam-lhes que fossem embora. 14 Ao ver isto, Jesus ficou muito descontente: “Deixem as crianças vir a mim! Não as devem impedir, porque o reino de Deus pertence aos que são como estas crianças. 15 É realmente como vos digo: quem não receber o reino de Deus como uma criança nunca entrará nele.” 16 E, acolhendo as crianças nos braços, colocou as mãos sobre elas e abençoou-as.
O jovem rico
(Mt 19.16-30; Lc 18.18-30)
17 Quando Jesus ir a sair dali, um homem correu para ele, ajoelhou-se e fez-lhe esta pergunta: “Bom Mestre, que farei para obter a vida eterna?”
18 “Porque me chamas bom?”, perguntou-lhe Jesus. “Não há ninguém que seja bom, a não ser Deus[h]. 19 Sabes o que dizem os mandamentos: ‘Não mates, não adulteres, não roubes, não faças uma falsa acusação contra outra pessoa, não enganes, honra o teu pai e a tua mãe.’ ”[i]
20 “Mestre”, respondeu o homem, “desde criança que tenho obedecido a todos estes mandamentos.”
21 Ao olhar para aquele homem, Jesus sentiu uma afeição profunda por ele: “Falta-te uma coisa: vai, vende tudo o que tens, dá o dinheiro aos pobres e terás um tesouro no céu. Vem e segue-me!” 22 Desanimado com estas palavras, foi-se embora triste, porque era muito rico.
23 Jesus, voltando-se, disse aos discípulos: “É quase impossível um rico entrar no reino de Deus!” 24 Os discípulos ficaram admirados com as suas palavras. Jesus, em resposta, de novo lhes explicou: “Meus queridos filhos, é muito difícil, para quem confia nas riquezas, entrar no reino de Deus! 25 É mais fácil um camelo passar pelo fundo duma agulha do que um rico entrar no reino de Deus!”
26 Os discípulos, porém, ficaram muito admirados, dizendo uns aos outros: “Então quem é que neste mundo poderá salvar-se?”
27 Jesus olhou para eles e respondeu: “Humanamente falando, ninguém, mas não no que toca a Deus. Na verdade, a Deus tudo é possível.”
28 Pedro começou a dizer-lhe: “Nós deixámos tudo para te seguir.”
29 E Jesus respondeu: “É realmente como vos digo: não há ninguém que tenha deixado casa, irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos e terras por minha causa e do evangelho, 30 que não venha a receber em recompensa cem vezes mais em casas, irmãos, irmãs, mães, filhos e terras, mas com perseguições, e no mundo futuro terá a vida eterna. 31 Porém, muitos primeiros virão a ser os últimos, e os últimos virão a ser primeiros.”
Footnotes
- 6.37 Ver nota a Mt 20.2.
- 7.3 Esta exigência, estabelecida por tradições religiosas ancestrais, não se deve a questões de higiene, mas de ritual.
- 7.7 Is 29.13.
- 7.10 Êx 20.12; Dt 5.16.
- 7.10 Êx 21.17; Lv 20.9.
- 9.48 Is 66.24.
- 10.8 Gn 2.24.
- 10.18 Com estas palavras, Jesus não expressa uma atitude de humildade, como se quisesse dizer que ele próprio não é bom. A intenção de Jesus parece mais bem ser testar a fé que o seu interlocutor teria nele e na sua autoridade, na qualidade de Deus e Mestre (v. 21).
- 10.19 Êx 20.12-16; Dt 5.16-20.
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